23 de setembro de 2004

Nelson

Nelson tinha muitas idéias, mas era sempre fácil culpar a falta de tempo para não pô-las em prática.
Queria montar todas as invenções que pensava, tocar as músicas que criava, escrever os textos que imaginava e pintar os quadros que só ele via, em sua mente.
Um dia inspirado por um filme resolveu que tinha que realizar suas coisas e partiu para o que julgou mais fácil, entrou numa papelaria chique, comprou um caderninho e uma caneta mais bacanas que seu dinheiro pudesse pagar e voltou pra casa cheio de si - "agora vou poder escrever todas as idéias de todos os textos brilhantes que tenho na cabeça".

Tomou um banho, se arrumou, perfumou, sentou-se na mesa em que jantava todos os dias e arrumou metodicamente o caderno e a caneta, lado a lado, perfeitamente paralelos. Nelson poderia enfim mergulhar na profundidade que ele sabia que existia em si, abriu seu caderno, empunhou sua caneta, encostou-a no papel, e se afogou no nada. Levou a caneta à boca e tentou relembrar o que era tão genial sobre seus pensamentos e as idéias que tinha a todo o momento durante o banho, quando dirigia ou enquanto esperava o sono chegar. Não conseguiu lembrar de nada a não ser um antigo sonho bobo que tinha tido quando criança.

“Acordei de manhã e o Pateta estava no meu quarto com um videogame novo, ele estava jogando um jogo em que o pintinho amarelinho do programa do Gugu pulava e dava cabeçada em outros bichos”.

Releu e entristeceu-se, até então não acreditava em inspiração, mas muito no seu potencial não revelado.
Quando não tinha tempo pra isso, era fácil se imaginar escrevendo mil coisas e sempre ansiava ter uma brechinha para poder fazê-lo, mas agora era tudo tão difícil que enfim a noite pesou nas pálpebras e lhe restou depositar as esperanças no futuro – “mas pior que amanhã tem um milhão de coisas pra resolver”, pensou.
E isso foi tudo o que o caderninho registrou.

1 Comentários:

Anonymous Anônimo disse...

Todos somos um pouco Nelson... Tá bem escrito!! Abração

www.fabiorocha.com.br

1:23 AM  

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